Piauí avança na inclusão da pessoa com deficiência
04/12/2006 - 00:12:34  
  
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Francisco Alencar, diretor de Gestão da Ceid

Por Robson Costa

No último domingo, dia 3 de dezembro, foi comemorado o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. A data foi criada pela ONU (Organização das Nações Unidas) com o objetivo de alertar sobre a necessidade de atender as demandas das pessoas com deficiência e lembrar que elas precisam ser vistas com as suas dificuldades. Por isso, é necessário que as cidades sejam acessíveis, que a saúde, a educação e o lazer sejam adequados.

As pessoas com deficiência precisam, antes de tudo, ter o direito de ir e vir, e para isso as barreiras arquitetônicas existentes na cidade precisam ser quebradas, mas é necessário quebrar também outras barreiras como a do preconceito. Mais de 500 mil piauienses têm algum tipo de deficiência, o que corresponde a 17% da população.

O diretor de gestão da Ceid (Coordenadoria Estadual para Integração de Pessoa Portadora de Deficiência), Francisco Alencar, explica nesta entrevista que o Piauí já obteve muitas conquistas para as pessoas com deficiência e outros trabalhos estão sendo executados para garantir uma melhor qualidade de vida para todos. Além disso, existe toda uma ação de conscientização e de prevenção para que o índice de pessoas com deficiência no Estado seja reduzido.

Alencar acredita que o Piauí já avançou muito na inclusão da pessoa com deficiência, mas lembra que muito ainda precisa ser feito para que haja uma sociedade inclusiva em todos os aspectos. Confira a entrevista:

Portal da Ceid - Domingo (3) foi o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. Após esses quatro anos da Ceid no Piauí, há o que se comemorar nesta data?

Francisco Alencar - Com certeza, há o que comemorar. O Estado do Piauí teve a felicidade de ter criado a Coordenadoria Estadual para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Ceid) e as políticas para pessoas com deficiência realmente passaram a ser implantadas de forma profissional, e com isso dando o que tem de melhor para a pessoa com deficiência e para a sociedade em geral. Nós sabemos que para cada pessoa com deficiência nós temos pelo menos outras duas pessoas envolvidas.

Portal da Ceid - Quais foram os primeiros passos dados pela Ceid para promover a inclusão da pessoa com deficiência?

Alencar - No Piauí existe um alto índice de pessoas com deficiência, mas talvez estes índices não fossem nem conhecidos. O primeiro trabalho da Ceid foi pesquisar onde estavam estas pessoas com deficiência. Nós descobrimos que 17% da população do Piauí têm algum tipo de deficiência, correspondendo a cerca de 500 mil pessoas. Este foi o ponto de partida. A partir daí, iniciamos o trabalho, fomos atrás para saber se essas pessoas estão sendo atendidas, que atendimentos elas têm. As pessoas com deficiência têm direito a benefícios? Que benefícios são esses? E esses benefícios estão chegando a essas pessoas? Fomos atrás dessas respostas. Nós trabalhamos muito nessa linha e conseguimos mapear as situações mais complicadas.

Portal da Ceid - Cite um exemplo.

Alencar - Descobrimos que São Gonçalo do Piauí é a cidade brasileira com o maior percentual de pessoas com deficiência do Brasil. Mas, além disso, das 50 cidades com maior índice de deficiência, 10 estão no Piauí. São números que passaram a ser trabalhados para que a pessoa com deficiência fosse vista por todos e não só pelas pessoas que têm algum parente nesta situação. Nós estamos indo a todo o Estado levando informação, conscientizando as pessoas. Fizemos o I Congresso Estadual em 2003, que foi um ponto de partida, e 14 Fóruns Municipais posteriormente. Antes da Ceid, incluindo o linguajar até mesmo da mídia, era tratada apenas a deficiência física. As deficiências auditiva, visual e mental não eram vistas dessa forma. Houve uma mudança de conceitos. Isso é um avanço, uma grande conquista. Os meios de comunicação também compreenderam isso e hoje falam a língua universal, que caracteriza cada deficiência individualmente.

Portal da Ceid - Além da conscientização, outro trabalho importante diz respeito à prevenção de deficiências. Como isso está sendo trabalhado?

Alencar - A partir dos levantamentos obtidos, fomos trabalhar a prevenção, com cursos de prevenção de deficiência, destinados aos agentes comunitários de saúde. Nós sabemos que quem chega realmente à comunidade, ao morador mais distante, é o agente comunitário de saúde. Nós realizamos treinamentos durante a realização dos fóruns, onde passávamos um dia inteiro falando só sobre prevenção de deficiência. Ainda na prevenção nós descobrimos que no Piauí não existia o teste do pezinho de forma mais acessível. Somente a Apae executava, mas em quantidade insuficiente. Se considerarmos que temos 6 mil nascimentos vivos por mês no Estado, a Apae fazia no máximo 800 exames. A partir daí, em parceria com a Secretaria de Saúde, foi implantado o Programa Estadual de Triagem Neonatal, e hoje existe a rede estadual que tem uma cobertura quase completa. Já passamos de 75% de cobertura. O exame é gratuito. Quando é detectada alguma alteração no exame, a criança passa a ser acompanhada por uma equipe multidisciplinar no Hospital Infantil Lucídio Portela. Isso foi um grande avanço na questão da prevenção. O foco principal dos fóruns municipais também era a prevenção.

Portal da Ceid - O atendimento e o acesso à saúde para as pessoas com deficiência também precisam ser prioritários?

Alencar - Exatamente. Por isso, da prevenção nós passamos para o atendimento à saúde. A realidade da reabilitação no Piauí estava um pouco complicada. Porque é preciso ter um atendimento de reabilitação que não seja somente de fisioterapia. Então, o Estado não tinha um serviço de reabilitação de excelência como o Sara Kubitschek, como a AACD. Buscamos um projeto ousado, como o próprio Ministério da Saúde classificou, mas ao mesmo tempo importante que é a Rede Estadual de Reabilitação, que consta de implantação de clínicas de reabilitação em cidades-pólo baseadas na regionalização da saúde do Estado. De modo que temos 33 cidades hoje ou que já receberam o Centro de Reabilitação ou que estão sendo concluídos agora. Até o início do próximo ano toda essa rede estará entregue.

Portal da Ceid - Existe também o Centro Integrado que está sendo construído em Teresina.

Alencar - Coroando esta rede, nós temos o Centro de Excelência em Reabilitação, que passamos a chamar de Centro Integrado de Reabilitação e que funcionará em frente à Maternidade Dona Evangelina Rosa. Ele está em fase de conclusão. No local, a pessoa com deficiência física terá o atendimento multidisciplinar. Significa dizer que uma pessoa precisa de reabilitação. Uma pessoa com paralisia cerebral será atendida por um neurologista, mas também vai precisar de um fisioterapeuta, de um terapeuta ocupacional e outros atendimentos. Essa pessoa, junto com a família, poderá passar por três ou mais profissionais num único dia no mesmo local. Mas, além disso, terá o atendimento interdisciplinar, onde os profissionais vão discutir o planejamento terapêutico para o paciente.

Portal da Ceid - A Ceid teve como exemplo algum centro que já está em funcionamento no Brasil para a construção do Centro Integrado de Reabilitação?

Alencar - O Centro é uma parceria da Ceid com a Secretaria Estadual de Saúde e buscamos o apoio do Sara Kubitschek, buscamos o apoio do CRER, de Goiânia, e buscamos a AACD. Estes três Centros têm nos ajudado no projeto. Principalmente a AACD que está nos acompanhando no auxílio desde a compra dos equipamentos até a seleção do pessoal que vai trabalhar. Inclusive, a AACD nos doou até a sua própria filosofia, que foi adquirida em mais de 55 anos de existência.

Portal da Ceid - O Centro Integrado de Reabilitação deve entrar em funcionamento quando?

Alencar - A previsão é que até o primeiro semestre do próximo ano o Centro esteja disponível para todas as pessoas que precisam de reabilitação.

Portal da Ceid - Qual a capacidade de atendimento?

Alencar - Nós temos uma capacidade considerável com mais 1.400 atendimentos por dia, ou seja, cerca de 450 pessoas por dia.

Portal da Ceid - Uma das principais reclamações da pessoa com deficiência é que a cidade não é acessível do ponto de vista da quebra de barreiras arquitetônicas. E Teresina vai ser contemplada com um projeto elaborado pela Ceid e aprovado pela Prefeitura Municipal e pelo Ministério das Cidades que vai permitir a acessibilidade no Centro Comercial de Teresina. Qual a importância dessa conquista?

Alencar - A acessibilidade é a palavra adequada para a inclusão da pessoa com deficiência. O Palácio de Karnak existe há anos, é o prédio mais importante do Governo, onde são tomadas as principais decisões do Estado, mas os cadeirantes não conseguiam entrar no prédio. Em seguida, foi o principal centro de eventos do Piauí, o Centro de Convenções, e depois, o Centro Administrativo, que hoje tem rampas e elevador. A rodoviária também foi adaptada. Mas ainda é pouco. As pessoas precisam ter a liberdade de ir e vir de qualquer ponto da cidade. Então, a Ceid viabilizou um projeto na Caixa Econômica para tornar o centro de Teresina acessível. As obras devem ser iniciadas no começo do ano e o centro de Teresina ficará acessível para as pessoas que têm dificuldade de locomoção. Terá rampas e vagas de estacionamento próprias para as pessoas com deficiência.

Portal da Ceid - Todas as construções que estão feitas hoje na cidade já incluem as rampas de acesso. Por outro lado, há ainda uma cobrança grande por uma quebra de preconceitos em relação à pessoa com deficiência. O senhor acredita que já está ocorrendo uma mudança de mentalidade da sociedade piauiense? As pessoas com deficiência estão sendo vistas com outros olhos?

Alencar - Nós sabemos que existem muitas leis. Não adianta querermos que elas sejam cumpridas simplesmente. Por isso, a Ceid sempre buscou sensibilizar para depois obter uma conscientização da população sobre isso. Quando a Ceid foi implantada, reunimos os empresários do Piauí para buscar uma conscientização, e hoje vemos o resultado. Percebemos uma mudança, uma evolução na quebra de preconceitos, na forma como é tratada a pessoa com deficiência. Ela passou a existir, a ser lembrada. Claro que ainda falta muito, mas as conquistas são bem visíveis e são percebidas em vários locais e em várias atitudes. Mas, a sociedade precisa avançar na quebra de barreiras do preconceito e cultural também. E cultura não se transforma rapidamente, por isso o tempo vai mostrando que as medidas estão sendo implantadas e cada vez a população vai compreender isso. Até porque, a qualquer momento, qualquer pessoa pode sofrer um acidente e pode se tornar uma pessoa deficiente. É por isso que Teresina tem mudado muito com relação à acessibilidade. São barreiras que rapidamente estão sendo ultrapassadas. Cada vez as pessoas com deficiência estão vivendo numa cidade e num Estado mais acessível.