Zilda Arns fala da importância da prevenção
23/10/2006 - 00:08:44  
  
Twitter 

Zilda Arns - Coordenadora Nacional da Pastoral da Criança

Por Elza Muniz

A Coordenadora Nacional da Pastoral da Criança, Zilda Arns, esteve no Piauí durante as comemorações dos 20 anos da entidade na região, celebrando uma parceria com Governo do Estado, ocasião em que fez um balanço positivo do trabalho da Pastoral no Piauí ao longo destas duas décadas. 

Médica, pediatra, casada, mãe de cinco filhos, há 23 anos, Zilda Arns atua na Coordenação Nacional da Pastoral da Criança. Esse trabalho já lhe rendeu importantes prêmios, como o reconhecimento do Fundo das Nações Unidas para a Infância e Adolescência (Unicef).

Zilda é responsável pelo acompanhamento de 1,6 milhão de crianças e 80 mil gestantes em mais de 32 mil comunidades espalhadas pelo País. Por conta desse trabalho, a mortalidade infantil nessas comunidades caiu para menos da metade da média nacional. Zilda advertiu sobre a elevação da anemia entre as crianças brasileiras e destacou a importância da prevenção e do pré-natal e alertou sobre o impacto da educação das mães na qualidade de vida dos filhos. Segundo ela, 90% das doenças poderiam ser prevenidas se as mães tivessem melhor educação. Confira esta entrevista que ela concedeu ao Portal do Governo.

Portal do Governo - Hoje, além do Brasil, a Pastoral da Criança está presente em 16 países. Quais são as projeções para 2007 e para um futuro próximo?

Zilda Arns - No Brasil, queremos ampliar a cobertura da Pastoral da Criança em cada comunidade e atender a todas as crianças pobres porque de acordo com a média nacional, estamos cobrindo 20% das crianças pobres, mas queremos chegar a pelos menos 50% daqui a três anos. Para isso, precisamos de maior mobilização e parcerias com mais pessoas ajudando a Pastoral da Criança. Estamos trabalhando para mobilizar mais comunidades para enfrentarmos a mortalidade infantil e a desnutrição.

Portal - O que motivou esse trabalho que senhora desenvolve há 23 anos com a Pastoral da Criança?

Arns - Como pediatra e sanitarista, eu atendia consultas de crianças, principalmente menores de um ano, e vi que 90% das doenças poderiam ser prevenidas se as mães tivessem melhor educação e decidissem mais corretamente sobre as atitudes a tomar. Eu propus esse trabalho quando veio a chance de eu trabalhar com a Igreja. Um pedido foi feito por dom Paulo Evaristo Arns, cardeal de São Paulo, que também é meu irmão. Ele esteve numa assembléia da ONU (Organização das Nações Unidas), em Genebra, onde se falava das violências do mundo. O diretor do Unicef disse a ele que poderiam ser salvas milhões de crianças através da Igreja se ensinassem o soro caseiro para mães. Então ele falou comigo e eu disse que não era somente soro caseiro, mas também pré-natal, aleitamento materno, uma alimentação saudável, vacinas, a educação infantil. Aí senti uma força muito grande porque o que eu sempre quis foi educar as mães, e isso eu fazia particularmente com cada uma que eu consultava. Depois, como diretora durante 27 anos, sempre promovi muita educação nos postos de saúde, nas maternidades. Então, chegava a chance de eu trabalhar diretamente com as famílias.

Portal - E a expansão do trabalho da Pastoral no Piauí?

Arns - Foi o resultado extraordinário da Pastoral da Criança aqui nas comunidades Eu gostaria que as outras crianças pobres também tivessem esse benefício, por isso estou aqui ampliando parcerias com o Governo do Estado para atingir pelo menos a metade dos pobres em três anos.

Portal - A senhora destacou um dado preocupante: a elevação da anemia não somente entre as crianças carentes, mas também na classe média. A que se deve esse fato e o que pode ser feito?

Arns - A elevação da enemia se deve a deficiência de ferro. As pessoas ingerem poucos alimentos que contenham essa substância. Os hábitos alimentares mudaram muito. Antes, comia-se mais frutas e verduras, mas hoje, a ingestão de alimentos ricos em ferro é pequena, não se toma um suco de frutas cruas ou uma fruta na refeição para aproveitar esse ferro. Então, falta a educação alimentar que deve ser dada às famílias e também ensinadas nas escolas.

Portal - A senhora sempre destaca a importância de se investir na primeira infância. O que é imprescindível nessa fase, em especial no quesito saúde e educação?

Arns - O desenvolvimento integral da criança é composto de saúde física, o que implica boa alimentação e vacinas e de uma boa educação infantil, que deve vir desde antes do nascimento. A mãe deve conversar muito e brincar, em vez de bater, ensinar jogos para que as crianças aprendam a ganhar e a perder e a evitar ficar só chamando a atenção e batendo na criança porque ela vai gerar violência no futuro.

Portal - Na primeira infância, a senhora compara o aleitamento materno a uma verdadeira terapia fundamental para o desenvolvimento do futuro adulto. Qual o impacto dessa ação na vida da criança?

Arns - O aleitamento é a primeira escola do amor e do diálogo. Horas e horas ao dia, a criança fica no colo da mãe recebendo o seu carinho. Então, a criança desenvolve toda musculatura, os ossos, que vão ajudá-la, no futuro, a ter uma melhor dicção, uma melhor respiração, a ser mais rápida no raciocínio, a ter uma arcada dentária mais saudável. Tudo isso a própria natureza preparou através da sucção e do próprio leite de peito. Então, é muito importante que as mães dêem de mamar só no peito. Hoje, tem aumentado a amamentação na classe média porque compreende a importância da alimentação. A orientação é até seis meses só no peito e, após esse período, o aleitamento deve ser enriquecido com outros alimentos.

Portal - A senhora também está trabalhando com a Pastoral da Pessoa Idosa. Aqui, no Piauí, o que levou a senhora abraçar essa causa?

Arns - Sou co-fundadora e coordenadora nacional da Pastoral da Pessoa Idosa e usamos o mesmo método da Pastoral da Criança. Estamos no Brasil com 41 mil idosos, e na Pastoral estamos com 1.400 idosos. Estamos trabalhando há três anos somente; agora, estamos capacitando 7 mil lideres; temos o apoio do Ministério da Saúde para essas capacitações e estamos procurando mais parcerias, mais voluntários que queiram abraçar essa causa. As pessoas idosas no Brasil são cada vez em maior número e têm muita baixa qualidade de vida na classe carente. Trabalhamos com fé e com vida, promovendo a saúde, a integração social, procurando integrar com programas de algumas prefeituras para que realmente cheguem aos mais pobres.

Portal - Como a senhora avalia os 20 anos de Pastoral no Piauí ?

Arns - Foram fantásticos. Estive aqui diversas vezes, acompanhei desde o inicio e acho que no começo o trabalho foi muito penoso porque a Igreja começa a pesar crianças, a ensinar soro caseiro, visitar famílias todo mês. Era uma novidade tanto para a Igreja quanto para os órgãos públicos, mas graças a Deus isso foi superado, e hoje a Pastoral tem credibilidade em toda parte, não somente no Brasil, mas também em mais 16 outros países onde ela está, e eu confio muito no governador do Piauí no sentido de colaborar com a Pastoral da Criança para vê se diminuem a pobreza e a miséria, mas, principalmente, a falta de conhecimento das famílias para cuidar melhor dos filhos.